Tratamento da Bexiga Neurogênica

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A avaliação urológica e o acompanhamento profissional do indivíduo com Espinha Bífida (EB) devem ser iniciados o mais precocemente possível para monitorar a função renal e prevenir lesões e infecções no trato urinário.

Para a avaliação de indivíduos com bexiga neurogênica deve-se considerar:
– anamnese (entrevista)
– exames urológicos (ex. ultrassonografia e urodinâmica)
– exames laboratoriais (ex. exame de sangue/função renal)

O tratamento urológico tem como objetivo a prevenção do trato urinário superior/rins e a continência urinária.

O cateterismo vesical intermitente (CI) associado ao uso de medicamentos geralmente é o tratamento mais escolhido. O treinamento para a realização do CI pode ser inciado com crianças a partir de seis anos.

O uso de medicamentos é um forte aliado ao CI no tratamento da bexiga neurogênica. Entre os principais fármacos utilizados atualmente estão:

− Anticolinérgicos: permitem que a bexiga armazene um maior volume urinário com menor pressão. Por exemplo: a oxibutinina e a tolterodina.

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Ilustração – ação da oxibutinina [ASBH-2009]
– Alfa-bloqueadores: facilitam o esvaziamento da bexiga. Entre eles o mais conhecido é a doxazosina.

– A aplicação de Toxina Botulínica na parede da bexiga tem se mostrado uma opção para alguns pacientes. Normalmente esse procedimento é realizado quando o indivíduo não tem resultados satisfatórios com o uso do medicamento oral.

– Existem outras possibilidades de tratamento mais invasivas e menos utilizadas, como por exemplo, as cirurgias (a vesicostomia, a derivação continente de Mitrofanoff, a ampliação vesical e as cirurgias esfincterianas).

Cateterismo Vesical Intermitente (CI)

O cateterismo vesical intermitente (CI) é considerado o tratamento padrão para a bexiga neurogênica. É o método de esvaziamento vesical mais utilizado na atualidade.

O CI contribui para o armazenamento da urina a baixas pressões na bexiga (evitando a pressão vesical elevada), auxilia o esvaziamento completo da bexiga (evitando os volumes residuais vesicais elevados) e ajuda a evitar infecção do trato urinário. Por isso, o CI é considerado eficiente para evitar complicação renal.

Essa técnica pode também representar uma possibilidade de continência vesical, evitando dessa forma constrangimentos devido às perdas urinárias e favorecendo a participação social e a sexualidade do indivíduo.

Algumas contra-indicações do CI são: estenose (estreitamento) da uretra, falsos trajetos uretrais, infecção do trato urinário grave, condições financeiras precárias, não colaboração familiar, desinteresse e desmotivação do paciente.

Como complicações do CI podemos citar: a infecção do trato urinário, desenvolvimento falso trajeto uretral, dor ou desconforto.

Classificação do CI:

– Autocateterismo: quando é realizado pelo próprio indivíduo, mesmo que em alguns casos seja necessária a supervisão de outra pessoa.

– Cateterismo assistido: quando é realizado por uma terceira pessoa (pais, avós, cuidadores, entre outros). Existem casos em que o CI é realizado de maneira assistida, entretanto, o indivíduo participa do procedimento, como por exemplo, auxiliando na higienização do meato uretral.

A seguir será descrita a técnica para a realização do cateterismo vesical intermitente limpo

Cateterismo vesical intermitente limpo: a técnica limpa consiste na higienização das mãos, uso de cateteres estéreis (recomendável), de lubrificantes e da limpeza do meato uretral antes que o cateter seja introduzido. Entre a limpeza do meato uretral e a introdução do cateter é recomendada uma segunda higienização das mãos.

Observação: Existem serviços de saúde que orientam o uso mesmo cateter por até 1 semana. Neste caso os indivíduos são orientados quanto à higienização e cuidados com o cateter. Entretanto, não há um consenso nem um protocolo padronizando o reuso dos cateteres.

Os cateteres podem ser classificados de acordo com:

– material: a maioria dos cateteres utilizados são derivados de plástico. Os cateteres de vidro e de metal não são mais indicados.

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Cateter Hidrofílico (pré-lubrificado)
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Cateter de Polietileno

– lubrificação: existem cateteres que já são pré-lubrificados, como por exemplo, os hidrofílicos.

– comprimento: podem ser mais curtos (com cerca de 20 cm) destinados ao público feminino e os mais longos (com cerca de 40 cm) ao público masculino.

– calibre: os mais utilizados variam do número 4 até o número 16, que pode variar de acordo com a idade e avaliação profissional.

– embalagem: pode conter o sistema coletor de urina junto ou não. Podem também ter o dispositivo não-toque ‘no-touch sleeve’ (permite a realização do CI sem tocar no cateter).

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Legenda: Cateter com sistema coletor de urina

Observação: a escolha do tipo de cateter deve ser individualizada e respeitar as particularidades de cada indivíduo, levando em consideração as condições financeiras, características individuais e as preferências pessoais. Normalmente a indicação do tipo do cateter é realizada por um enfermeiro.

Descrição dos passos da técnica do cateterismo vesical intermitente

Posicionamento
– O indivíduo poderá realizar o CI na posição deitada, sentada ou de pé. Poderá realizar o procedimento no vaso sanitário, na cadeira de rodas ou na cama.

– Nos homens a posição do pênis deve fazer um ângulo reto com a região pubiana.

– Para as mulheres existem alguns recursos como o espelho com barra que auxilia a abertura dos membros inferiores, que podem ser utilizados para facilitar o posicionamento, a visualização do meato uretral e permitir a liberação das mãos durante a realização da técnica.

– As crianças que ainda não realizam o autocateterismo devem ser incentivadas a ficarem na posição semi-sentada durante a realização do CI, com o objetivo de acompanharem a técnica e assim irem aprendendo as etapas do procedimento. Sempre que possível a criança deve ser estimulada a participar do procedimento, como por exemplo, segurando o gel para lubrificação.

Higienização da genitália

As substâncias mais utilizadas para a higienização da genitália são água e sabão, de preferência neutro.

Lubrificação

O uso do lubrificante é importante para facilitar a introdução e o deslizamento do cateter, além de diminuir os riscos de traumatismo da uretra e o incômodo em pacientes com sensibilidade da uretra preservada.

A lubrificação pode ser realizada diretamente na uretra e/ou sobre o cateter.

A lubrificação do cateter pode ocorrer de duas formas: na primeira o cateter já vem pré-lubrificado (hidrofílico) e na segunda o gel lubrificante é colocado sobre o cateter e/ou colocado no orifício da uretra.

Drenagem da urina

Após posicionar-se adequadamente, realizar a higienização do meato uretral e lubrificação, o cateter deve ser introduzido via meato uretral até a urina começar a fluir, e deve ser retirado lentamente somente quando o fluxo da urina estiver acabado completamente. Essa drenagem da urina pode ser realizada diretamente no vaso sanitário, em um saco coletor ou em algum recipiente limpo. Alguns cateteres possuem um sistema coletor de urina acoplado.

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Cateterismo Vesical Intermitente Masculino [ASBH-2009]

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Cateterismo Vesical Intermitente Feminino [ASBH-2009]

Observação: a freqüência diária indicada para a CI varia de 4 a 6 vezes ao dia, de acordo com a capacidade da bexiga, a quantidade da urina e as perdas urinárias entre os intervalos do CI.

COMO FAZER?

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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FONTE: Equipe MieloFórum