Por várias vezes já fui abordado por pessoas com dúvidas sobre ser ou não “pessoa com deficiência”. Não que exista determinada característica para que alguém seja “rotulado” como tal, mas é importante esclarecer e compreender o que de fato pode ser considerada uma deficiência, para diversos fins, como por exemplo, o acesso a determinadas políticas públicas, verificar a titularidade de direitos e deveres específicos para esse público, dentre outras finalidades.

Então vamos lá, farei uma breve análise, tomando por base critérios objetivos do ordenamento jurídico brasileiro.

A rigor, um laudo médico é que poderá dizer e provar sobre a existência de uma deficiência. Mas é interessante sair do plano clínico, extrapolar o papel e pensar o porquê alguém pode ser considerado como pessoa com deficiência ou sem deficiência no mundo dos fatos.

Descrição pra cego ver: Banner com símbolos de pessoas no centro com interrogações nos cantos.

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Nos termos da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, assim como reafirmado pelo art. 2º da Lei Brasileira de Inclusão da PcD (Lei nº 13.146/2015),  considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

É importante destacar aqui três elementos definidores e necessários que podemos extrair desse conceito legal de deficiência, a saber: 1. Impedimento a longo prazo; 2. Barreira para participação social; 3. Desigualdade de condições.

O primeiro elemento, o “impedimento a longo o prazo”, pode ser de ordem física, mental intelectual ou sensorial. Daqui decorrem várias espécies ou classificações de deficiência, como a física, auditiva, visual, mental, intelectual, psicossocial, ou seja, para que se considere pessoa com deficiência, ao contrário do que muita gente pensa, nem sempre o impedimento será visível ou aparente, essa é uma característica que pode ser comum na deficiência física, mas não na deficiência mental por exemplo.

Então cuidado para não julgar determinadas situações sem ter conhecimento de causa! Vale destacar ainda que, não há óbice para que esses “impedimentos” sejam transitórios, desde que sejam por longo prazo.

O segundo elemento constitui-se pelas “barreiras para participação social”, que, na forma da lei, seriam qualquer entrave, obstáculo, atitude ou comportamento que limite ou impeça a participação social da pessoa, bem como o gozo, a fruição e o exercício de seus direitos à acessibilidade, à liberdade de movimento e de expressão, à comunicação, ao acesso à informação, à compreensão, à circulação com segurança, entre outros.

Essas barreiras, são destacadas no art. 3º, IV, da Lei Brasileira de Inclusão da PcD, e podem ser de natureza urbanística, arquitetônica, de transportes, de comunicação, tecnológicas e atitudinais. Aqui eu vou chamar atenção para esta última, que entendo ser a mais gravosa para as pessoas com deficiência. As barreiras atitudinais são compostas por atitudes e comportamentos capazes de impedir e prejudicar a participação social da PcD de forma digna e em igualdade de oportunidades, e deve ser combatida, sobretudo, com informação, respeito e cidadania.

O terceiro elemento configura-se pela a “desigualdade de condições”. Aqui a ideia fundamental é preservar o princípio constitucional da igualdade, em toda e qualquer forma de participação social. Se, em virtude de algum impedimento, houver barreiras capazes de gerar alguma diferença na forma de participação na sociedade, a desigualdade de condições estará presente e deverá ser combatida.

Sendo assim, na dúvida em ser ou não ser pessoa com deficiência, é interessante que se faça essa leitura refiinada dos fatos e que se busque identificar esses elementos caracterizadores.

Não é atoa que a própria legislação de defesa dos direitos das pessoas com deficiência, trabalha todos esses conceitos de forma clara e direta. Ser pessoa com deficiência não é privilégio, muito menos um desprivilégio. É ser pessoa humana, como qualquer outra, mas com algumas características diferentes, qualidades que podem implicar em impedimentos ou barreiras que as deixem em desigualdades de condições com as demais pessoas.

Thiago Helton

Source: Afinal de contas, quem é pessoa com deficiência? – Prisma – R7 Thiago Helton