Nascido prematuro aos seis meses e meio de gravidez, e adquirindo uma paralisia cerebral por falta de oxigenação no cérebro, o cadeirante e jornalista Paulo Fabião está iniciando uma carreira de sucesso como humorista em São Paulo, capital. Longe de ser o tipo de pessoa que se entrega e se vitimiza por sua condição física, este é um personagem ideal para a coluna Tetraplégicos Unidos, da revista digital Comunica Tudo.

Formado em jornalismo, cadeirante de nascença e contrariando expectativas, Paulo Fabião reúne um material composto por observações, vivências e opiniões adquiridas ao longo de seus 32 anos, para realizar o primeiro show solo – “Esperando Sentado”, que arranca gargalhadas do público em seu Stand Up Comedy.

No show de aproximadamente 70 minutos, o comediante fala das suas vivências e situações cotidianas enquanto cadeirante, e relata com muita ironia e sarcasmo, a forma mascarada e preconceituosa que a sociedade encara e trata as pessoas com deficiência. “São situações que deveriam ser comuns para outros, como é para mim”, conta o humorista.

Esclarecendo dúvidas e quebrando tabus ao falar de acessibilidade, relacionamentos, sexo e outros temas atuais da sociedade, o humorista também marca presença nas redes sociais como Facebook, com mais de 14 mil seguidores, no Instagram, divulgando ainda alguns vídeos no seu canal do YouTube.

Paulo Fabião se apresenta em grandes palcos como o do Teatro Ruth Escobar, Teatro Ressurreição, Bar Ao Vivo Music, Bar Do Rone, Comédia Império, Beverly Hills, Sorocaba Comedy Club e Coritiba Comedy Club. Faz parte do grupo Paralamas da Comédia. Além do Rio de Janeiro, já se apresentou no litoral, interior de São Paulo e Curitiba. Também já abriu o show solo “Isso é Tudo que eu tenho” de Thiago Ventura, no Teatro Frei Caneca.

Você é jornalista e humorista. De onde surgiu sua vontade de escolher o jornalismo como profissão?

Desde muito pequeno eu me apaixonei pela leitura, e consequentemente, pela escrita. Sempre gostei de contar e escrever histórias, então quando eu soube, ainda jovem, que existia uma profissão que se escrevia histórias, não tive dúvidas em escolher o jornalismo.

Você fala muito bem sobre você, com um humor ácido e inteligente. Utilizando então, a sua visão, fale sobre como é ser uma pessoa com deficiência física no mundo de hoje, em um país como o nosso?

Ser deficiente hoje é bem mais fácil do que ser deficiente no tempo dos nossos pais e avós, por exemplo. Até poucas décadas atrás, o deficiente não podia sair de casa, seja por falta de estrutura e/ou por falta de informações das outras pessoas sobre como lidar com um deficiente.
Hoje a acessibilidade é bem maior (até por ser lei) e as informações são bem mais difundidas. Entretanto, ainda é pouco. Ainda vivemos em uma sociedade bastante preconceituosa em relação à questão da deficiência. O Deficiente é um grupo minoritário bem menos discutido, em comparação a outras minorias como: as mulheres, os negros e os homossexuais.

Sobre o mercado de trabalho, uma questão que incomoda as pessoas com alguma deficiência que têm nível superior, é o fato das empresas contratarem, por exemplo, aqueles com deficiências mais brandas para exercer funções que não exigem nível superior de formação apenas para preencher a cota. Qual é sua visão geral e sua opinião a respeito?

É horrível! Sem cotas o deficiente não é contratado e a lei de cotas é uma grande falácia por dois motivos: empresas só querem cumprir a cota então, geralmente oferecem somente oportunidades em cargos de níveis mais baixos de intelecto, então mesmo o deficiente com graduação superior, “se quiser trabalhar” tem que aceitar ser faxineiro ou ascensorista.
Se não bastasse isso, a cota é para pessoas com deficiência, o que torna esse leque extremamente abrangente. Assim sendo, uma pessoa cadeirante compete na cota com alguém sem o mindinho apenas, e obviamente as empresas contratarão o segundo perfil, pois necessita de menos adaptações, o que é obviamente mais barato.
Então a inclusão do deficiente no mercado de trabalho é precária, pra não se dizer, mentirosa! Esse, alias, foi um dos motivos que me fez tentar me arriscar no humor. Precisei achar alguma forma de sobreviver sem depender do mercado formal de trabalho.

Sobre profissionais como o humorista Geraldo Magela, “O Ceguinho”, além de outros com diferentes tipos de deficiência. Como você vê a escassez dessas pessoas como atores sérios, jornalistas, apresentadores e as mais diversas profissões na televisão?

Parte desta pergunta está respondida na questão anterior. Em relação ao humor, ele tem esse fator de diferente em relação às outras profissões: o “diferente” é visto como algo positivo. A dificuldade, o preconceito é material para se fazer piada, especialmente de si mesmo. Dificilmente uma pessoa que não sofre nenhum preconceito ou dificuldade e tem uma vida estável consegue ser um bom comediante.

Como você enxerga o fato de atores, por exemplo, com nanismo, atuarem em papéis de humor, negros atuando, majoritariamente como empregados, e outros atores com diferentes condições – que fogem do estereótipo tido como normal pela sociedade – em papéis secundários que diminuem a imagem dessas pessoas? Por que não há protagonismo para essa gente?

Não há protagonismo porque ainda vivemos em uma sociedade majoritariamente preconceituosa em relação a tudo e todos que fogem do padrão elitista da sociedade e a mídia reflete a sociedade.
O negro ainda é visto como inferior, o homossexual é somente o “estereótipo da bicha afetada” e o deficiente (seja anão, cadeirante, ou até mesmo os obesos) é visto apenas como “escape cômico”, ou seja, aquele que é ridicularizado para que as pessoas possam rir.
Eu acredito que nosso protagonismo tem que partir de nós mesmos. A sociedade, e consequentemente, a mídia, não está preparada nem disposta para isso, então temos que ser protagonistas na marra.

(Via Rafael Ferraz, jornalista e autor da coluna Tetraplégicos Unidos)