de papo com claudinha

Bem para início de conversa me chamo Cláudia Medeiros de Araújo, moro em Caicó-RN e tenho deficiência física e no início de 2014  fui ao DETRAN com a pretensão de obter minha Carteira Nacional de Habilitação e lá fui informada que eu teria que ir a Natal (a qual dista 280 km de Caicó).

Para eu poder ser avaliada por uma junta médica especial que no meu caso, expediu um laudo que determinava que eu era  obrigada a dirigir  veículo com transmissão automática, direção hidráulica e com prolongadores dos pedais e elevação do assoalho e/ou almofadas fixas de compensação de altura e/ou profundidade, devido a minha deficiência física.

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Sai do DETRAN de Natal, muito feliz com essa probabilidade, já sentindo aquela impressão de liberdade e ao mesmo tempo pensando que não ia mais ter que aguentar as “belas” calçadas cheias de buracos, nem atolar as muletas na lama quando chovia, nem muito menos me queimar debaixo do sol causticante do nosso Sertão seridoense durante as idas e vindas do trabalho.

E foi com essa alegria que corri para fazer minha matrícula em uma autoescola de Caicó-RN e lá veio o primeiro balde de água fria, que fez com que meu contentamento logo desse lugar a uma baita dor de cabeça, pois para meu espanto fui  avisada que eu não poderia fazer as aulas práticas em Caicó, pois a cidade não possuía nenhuma empresa de Formação de Condutores que dispusesse de veículo  com transmissão automática e direção hidráulica atendendo assim as minhas necessidades.

 Mesmo assim decidir fazer as aulas teóricas em Caicó, e enquanto eu cursava as aulas pesquisava a existência de alguma auto escola no Estado que me atendesse. Descobrir a existência de uma em Parnamirim, entretanto eles logo me avisaram que apesar do veículo ser adaptado era uma adaptação manual, ou seja, com ela o motorista usa as mãos para frear e acelerar.

Informei que no meu caso a adaptação era outra já que constava no laudo. Tentei ainda explicar que esse tipo de adaptação que existia no carro deles era voltada para atender pessoas paraplégicas, ou seja, que não possuem movimentos da cintura para baixo. Já a minha deficiência era diferente pois, tenho os movimentos das pernas entretanto, possuo baixa estatura. No entanto, foram taxativos ao afirmarem que a adaptação era a que eles possuíam.

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Diante dessa situação continuei a busca por outra autoescola já que o veículo da empresa de Parnamirim não atendia as minhas necessidades,  e fui informada da existência de uma na cidade de Mossoró depois de ter sido aprovada no curso teórico e com a proximidade das minhas férias do trabalho fui a Mossoró.

Lá eu fui bem recebida, vi o carro, conversei com o instrutor, com o proprietário da escola e ficaram acertadas as aulas para as minhas férias, pois o horário do meu trabalho não permitiria esse translado entre Caicó-Mossoró diariamente.

Foi marcado o início das aulas para o dia 07/07/2014, todavia adoeci com uma conjuntivite e passei uma semana sem poder sair de casa fazendo o tratamento recomendado pelo médico. Remarcamos então para o dia 22/07/2014, entretanto a pessoa que faz as adaptações no único carro que podia me atender sofreu um acidente e está impossibilitado de fazer as adaptações e consequentemente eu fiquei sem as aulas e ainda não sei quando será possível fazê-las.

autoescola

 É significante informar que a justificativa dos proprietários das autoescolas para não possuírem os veículos  adaptados é que esses possuem um custo elevado para atenderem uma pequena clientela. Para mim, esse discurso não se sustenta, pois como professora sei que quando uma criança com deficiência chega a uma escola seja ela pública ou privada, somos obrigados a recebê-la e darmos o mínimo de condições para que ela estude, sob pena de respondermos na justiça.

Afinal de contas a educação é um direito de todos e para todos. Ou seja, para recebermos essa criança a escola precisa construir rampas, instalar elevadores, adaptar banheiros, adquirir mobiliário especial e softwares, etc. E essas adaptações também têm um custo elevado para atender um pequeno número de crianças.

Da mesma forma, espaços públicos como shopping, restaurantes, bares, lojas etc, são obrigadas a se adequarem, respeitando assim o direito da pessoa com deficiência física de ir e vim. Do mesmo modo os concursos públicos e as empresas são obrigadas a respeitar a cota para deficientes.

E é seguindo essa linha de raciocínio que questiono até quando os direitos de igualdade, acessibilidade e dignidade das pessoas com deficiência serão desrespeitados pelas auto escolas do RN e especialmente de Caicó (Centro Regional da Região do Seridó)? Será que as pessoas sem deficiência no RN e especialmente no Seridó vão continuar participando de suas aulas e exames práticos, sem maiores problemas, pois existem veículos em número suficiente para atendê-los, enquanto isso, pessoas com deficiência como eu, tem que sair de sua cidade, se cansar com longas e onerosas viagens e ausentar-se do trabalho durante vários dias?

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É também importante destacar, que por volta da segunda quinzena do mês de agosto entrei novamente em contato com o proprietário da empresa de Mossoró que me informou que resolveu nesse período, em que a pessoa que faz as adaptações se recuperava comprar um novo carro para atender as pessoas com deficiência e agora está esperando receber da Concessionária o novo veículo, ainda precisará ir ao Detran para regularizar tudo e fazer as adaptações necessárias que os alunos vierem precisar e tudo isso leva tempo. Inclusive hoje, dia 08/09/2014, liguei para lá e fui informada pela secretária que eles ainda não receberam o veículo.

Em novembro de 2014, procurei o Ministério Público para denunciar que os direitos de igualdade, acessibilidade e dignidade das pessoas com deficiência de Caicó estão sendo desrespeitados no momento de tirar a CNH.

Além disso, falei que as pessoas sem deficiência no RN e especialmente em Caicó participam de suas aulas e exames práticos, sem maiores problemas, pois existem veículos em número suficiente para atendê-los, enquanto isso, pessoas com deficiência como eu, tem que sair de sua cidade, se cansar com longas e onerosas viagens e ausentar-se do trabalho durante vários dias.

O Ministério Público averiguou todas as minhas denúncias, mas infelizmente constatou que não há nenhuma lei que possa assegurar o meu direito de tirar minha CNH na cidade que resido. E como só terei férias no próximo ano ficarei impossibilitada de dá continuidade ao meu processo de tirar CNH, pois o mesmo se vence em janeiro de 2016 e minhas férias só serão no próximo ano.

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Por fim, gostaria de saber até quando as pessoas com deficiência que residem em cidades do interior terão o direito de tirar sua Carteira Nacional de Habilitação em pé de igualdade com as pessoas sem deficiência? Diante de tantas impossibilidades só me resta agora fazer um apelo para o Luciano Huck fazer um quadro Lata Velha Especial e debater a necessidade de autoescolas, em cidades do interior, possuírem uma Lata Velha Adaptada.

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