É mais que normal à dificuldade na compreensão de como as bancas de concurso público devem avaliar as aprovações de candidatos com deficiência. Justamente por esse déficit de compreensão, o “Mão na Roda” traz hoje uma decisão mega simplificada e de fácil entendimento publicada pelo Ministro Celso de Mello sobre os termos legais que possibilitam a concorrência em vagas reservadas de acordo com as referências da deficiência do candidato. Além de apresentar a decisão do Ministro, vou explicar quais as principais garantias no que tange o concurso público às pessoas com deficiência.

Bom, segundo a Constituição Federal, a investidura em cargo público depende de aprovação prévia em concurso público de provas de acordo com a natureza e a complexidade do cargo. Com base nisso, desde 1988, todas as seleções de candidatos para cargos públicos são realizadas por meio de concurso. A Constituição Federal também estabelece a necessidade de reservar um percentual dos cargos públicos para as pessoas com deficiência. Tal norma está expressa no inciso VIII do Art. 37. Garantida também no § 2º, art 5º da Lei 8.112/1990, que: assegura o direito de a pessoa com deficiência se inscrever em concurso público, reservando até 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas no certame. A legislação garante pelo menos uma vaga para os candidatos com deficiência, mesmo no caso do percentual obtido ser menor que 1 como define o parágrafo § do artigo 37, “caso a aplicação do percentual de que trata o parágrafo anterior resulte em número fracionado, este deverá ser elevado até o primeiro número inteiro subsequente”.

Sobre isso, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, também reconhece nosso direito ao trabalho enquanto pessoas com deficiência. Ressaltando a igualdade de oportunidades com os demais, enfatizando a necessidade de coibir a discriminação e promover o respeito a todas as questões relacionadas ao emprego, inclusive condições de recrutamento, admissão, permanência no emprego, ascensão profissional e condições seguras e salubres de trabalho.

Uma coisa importantíssima e necessária a propagação é que nós, pessoas com deficiência devemos participar do processo de seleção em igualdade de condições com os demais em relação ao conteúdo, à avaliação, aos critérios de aprovação, ao horário e ao local de aplicação das provas ou exames. Porém, é preciso que o edital nos garantam a oferta ao tratamento necessário para que haja a equiparação de oportunidades.

Que tratamentos são esses?

Simples, a utilização de apoios é um direito nosso e deve ser prestado com excelência, visto que significa a equiparação, igualdade de oportunidades na concorrência. O objetivo é tornar o conteúdo da prova ACESSÍVEL e não tornar o conteúdo diferenciado. Dessa forma, os apoios devem ser oferecidos de acordo com as deficiências e necessidades apresentadas pelos candidatos. Por exemplo:

  1. Salas destinadas à amamentação
  2. Sala de fácil acesso
  3. Mesa e cadeiras separadas
  4. Prova em braile
  5. Intérprete de Libras.
  6. Mesa para usuários de cadeira de rodas
  7. Magnificação de tela
  8. Computador para provas discursivas
  9. Ledor e transcritor
  1. Prova ampliada com o tamanho da fonte indicada pelo candidato.
  2. Prova em vídeo em Libras
  3. Português como segunda língua
  4. Sala com número reduzido de participantes ou sala separada para a realização da prova com ledor
  5. Prova do Ledor: roteiro de leitura com a adaptação de imagens, padronizando as informações oferecidas pelo profissional e adoção de medidas para garantir a qualificação mínima dos ledores de provas. Computador com leitor de telas de uso livre (Exemplos: NVDA, DOSVOX).

Outro quesito  que necessita de uma abordagem padronizada na elaboração dos editais é a adoção da terminologia “pessoa com deficiência”, já me posicionei sobre o uso dessas terminologias bonitinhas e frufruzentas. Contudo sempre deixei claro que defendo sim o uso adequado em situações e formais. Hoje defendo no que diz respeito ao edital (documento formal) com todas as informações de um concurso público ou processo seletivo. O uso da terminologia correta nessa situação é muito mais que a atualização de um termo. É uma questão de respeito.

Após garantir que tenhamos o pleno acesso ao conteúdo do edital, é preciso que nos permitam total autonomia na realização da inscrição e acompanhamento de todo o processo seletivo. Para isso, é primordial que, em caso de o processo ser disponibilizado na internet, todas as páginas obedeçam aos padrões mínimos de acessibilidade. A Lei nº 10.098/2000 esclarece que acessibilidade “é a possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos transportes e dos sistemas e meios de comunicação”. Isso significa que as provas e avaliações devem ser elaboradas provendo condições equitativas a todos os candidatos.

Uma interpretação errônea e que impera no meio dos julgadores das bancas de concurso é que deficiência é tão somente aquela que justifique a limitação na execução dos encargos do ofício a ser ocupado. Não serei injusto acusando as bancas e seus julgadores como se eles tivessem criado essa “tese”, não mesmo. Afinal eles se baseiam na redação dos incisos I e II, do art 3º do Decreto 3.298/99, que define deficiência como “toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal para o ser humano; e deficiência permanente aquela que ocorreu ou se estabilizou durante um período de tempo suficiente para não permitir recuperação ou ter probabilidade de que se altere, apesar de novos tratamentos” (…)

Não é certo, legal e digamos nem “cult”, propagarmos uma interpretação errônea sobre esse dispositivo legal. O que acho lindo no direito é a viabilidade de discussões e conclusões que conseguimos obter quando olhamos o Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999… desde o primeiro ao sexagésimo artigo, fica fácil entender que o objetivo fundamental do texto é garantir a nós, pessoas com deficiência, a inserção no quadro colaborativo do serviço público, salientando sua extrema competitividade e, ressaltando a equidade no desempenho eficaz dos cargos a serem ocupados.

Nesse sentido, como eu disse lá no primeiro parágrafo, o Min. Celso de  Melo adotou fundamentado em razões do Ministério Público, na publicação do Processo Eletrônico (DJe-094 DIVULG 16/05/2014 PUBLIC 19/05/2014) como Relator da Tutela Antecipada no Recurso Ord. em Mandado De Segurança que: é necessária a necessidade do alinhamento das normas internas de acordo com os tratados internacionais de direitos humanos, garantindo a nós, pessoas com deficiência, maior eficácia no cumprimento da norma oferecendo-nos dignidade, autonomia, plena e efetiva participação e inclusão na sociedade, o  respeito pela diferença e a igualdade de oportunidades.

Além disso, na decisão proferida, o Ministro destaca que, “o deficiente tem direito de acesso aos cargos públicos, desde que devidamente caracterizada a deficiência e que esta não seja incompatível com as atribuições do cargo postulado”. Caro leitor, é extremamente importante que divulguemos que: quando um ÓRGÃO PÚBLICO receber um candidato com deficiência é de total responsabilidade desse mesmo órgão, instituir todas as normas que adapte o exercício das funções pertinentes ao cargo às características evidenciadas em razão da deficiência. A partir desta decisão, esperamos que todos os candidatos com deficiência, sintam-se protegidos pela Lei, e possam ter tal proteção respeitada pelas bancas de concurso.

Sobre o assunto de hoje baseei-me bastante nas ricas informações jurídicas encontradas na cartilha elaborada sobre a promoção da acessibilidade e remoção de barreiras em processos seletivos, pelo grupo de trabalho formado em iniciativa conjunta da: Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal.  /  Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência.  /  Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP)  /  Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG)  /  Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP/MEC).  /  Ministério da Educação (MEC).  /  Ministério do Trabalho (MTE).  /  Organização Nacional dos Cegos do Brasil (ONCB)  /  Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Conade).

Baixe aqui a cartilha: Normas de acessibilidade para os processos seletivos de pessoas com deficiência.

Fonte: Concurso Público: A acessibilidade no processo seletivo para pessoa com deficiência | Blog Mão na Roda da Rede Globo