Resultado de imagem para violência sexual deficienteDia 3 de dezembro foi comemorado o “Dia Internacional da Luta das Pessoas com Deficiência” (Falei sobre isso na ultima postagem). Segundo dados do último censo demográfico do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 45,6 milhões de pessoas tem algum tipo de deficiência, ou seja, 23,9% da população brasileira. Contudo esse número deveria ser contabilizado também em outra categoria “os invisíveis”. Caro leitor, não estou exagerando. Vivemos uma cultura da falsa inclusão. Fingimos que respeitamos as vagas preferenciais. Fingimos ceder a preferência em filas. O sistema educacional finge incluir o aluno com deficiência, mas na verdade o estudante enfrenta demandas de acessibilidade atitudinal, arquitetônica, comunicacional, instrumental, metodológica e programática. Muitos desistem da qualificação por não serem incluídos no meio acadêmico. As empresas fingem manter a contratação de profissionais com deficiências etc.

 

Contudo vou abrir um parêntese aqui. (Não estou justificando a ausência, desistência, falta de interesse de alguns deficientes. Afinal defendo a máxima que “quem quer, faz por onde” – sim, eu sei que soa radicalismo, mas também é puro realismo. Concordo que nem todo mundo tem estrutura familiar, psicológica, fraterna etc pra lidar com demandas como as citadas, entretanto, todos nós temos uma mesma coisa, GARANTIA DE DIREITOS. Outra hora conversaremos sobre isso)… Continuando…

 

Essa invisibilidade, esse fingimento inclusivo, o fingimento da garantia dos direitos das PCDs (Pessoas com Deficiência), tem chamado atenção pra um tema e dados alarmantes. A “violência sexual contra mulheres com deficiência”. Todos nós imaginamos o quanto esse tipo de abuso deixa cicatrizes pra o resto da vida, porém só imaginamos. Só quem já foi vítima consegue mensurar com realidade a dor, a repulsa de momentos que infelizmente não serão esquecidos.

 

Algumas pesquisas apontam um número repulsivo e preocupante como o fato de que em 2015 aqui no Brasil, a cada 11 minutos 1 mulher foi estuprada. Esse número foi calculado pelo ABSP (Anuário Brasileiro de Segurança Pública), contudo outras pesquisas alertam que essa “conta” fechada pode representar apenas a ponta de um frio e angustiante iceberg, ou seja, cerca de 10% do total de casos que aconteceram de fato. Obviamente que apurações regionalizadas feitas por outras “instituições” podem ter menores ou maiores pontos percentuais em relação ao divulgado. Contudo, independente de qualquer pesquisa, qualquer taxa que traga essa barbaridade em números é de causar ânsia.

 

Essa ânsia que deve ser multiplicada e transformada em medidas cautelares mais severas. Aqui no Brasil temos a vergonha de carregar o título de quase 500.000 estupros por ano. Um crime que  tem a maior taxa de subnotificação do mundo, ou seja, infelizmente grande parte das vítimas não registra ocorrência. Conclusão, o total de casos pode ser dez vezes maior.

 

Com essa introdução apresentei dados que categorizam os abusos abrangendo TODO o gênero feminino. Como você já sabe, o “Mão na Roda” traz assuntos relacionados às pessoas com deficiência e, lá no terceiro parágrafo eu citei a “violência sexual contra mulheres com deficiência”, que é justamente o nosso tema de hoje.

 

Depois dessa noção do quadro num todo, frente ao assunto, abaixo “destrincho” alguns dados focados na violência contra as mulheres deficientes que, sem nenhum ceticismo tem as suas deficiências como premissas para a invisibilidade social, consequentemente invisibilidade dos abusos físicos, psicológicos, morais, sexuais etc que sofrem diariamente.

 

Em hipótese alguma estou desmerecendo a mulher sem deficiência, contudo a mulher deficiente por si já é mais vulnerável a qualquer tipo de abuso. Seja sua limitação física, sensorial, visual, auditiva, intelectual etc. Considerando a limitação, o agressor alimenta um senso de impunidade maior. Assim, sentindo-se mais “confiante” pra continuar com o crime e permitindo-se cometer outros tipos de abusos.

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Mas por que essa “autoconfiança” do agressor?

Não é nada fácil uma mulher chegar numa delegacia, instituição e afins pra denunciar algo do tipo. É extremamente doloroso e constrangedor mostrar sua vulnerabilidade pra pessoas desconhecidas. Agora imagine uma mulher com deficiência que decide procurar ajuda e denunciar o abuso, mas encontra aquelas faltas de acessibilidades que citei lá no início. Acessibilidade atitudinal, arquitetônica, comunicacional, instrumental, metodológica, programática etc.

 

Quando falamos em acessibilidade temos a mania de lembrarmos exclusivamente de rampas, elevadores, vagas preferenciais, pisos táteis e qualquer coisa relacionada ao ambiente físico. Contudo a acessibilidade é mais é muito, muito mais. Vamos às definições e exemplos:

 

Acessibilidade atitudinal: Refere-se à percepção do outro sem preconceitos, estigmas, estereótipos e discriminações. Todos os demais tipos de acessibilidade estão relacionados a essa, pois é a ATITUDE DA PESSOA QUE IMPULSIONA A REMOÇÃO DE BARREIRAS. Um exemplo clássico da falta desse tipo de acessibilidade? O comportamento boçal de motoristas estacionarem seus veículos obstruindo as rampas de acessibilidade, ou ocupando as vagas de estacionamento exclusivas pra deficientes, um lixeira bem no rumo dos botões do elevador, carrinho de limpeza dentro de banheiros adaptados… Ou seja, tudo que de modo intencional ou não, impeça o acesso de outras pessoas a algum local. Assim é fácil imaginar uma cadeirante tentando estacionar seu carro na vaga mais próxima da Delegacia da Mulher, mas um condutor sem noção ocupou a vaga só por um minutinho. Automaticamente essa barreira já desestimula a ação do denunciar. Ela achará mais fácil desistir de “brigar” pela vaga, pois já está tão violada, ferida que não quer arrumar “encrenca” com mais ninguém, assim, seu emocional a convence deixar quieto, ir embora e acreditar que a agressão não continuará. Se essa mesma mulher não estiver dirigindo, mas ao tentar acesso à delegacia, e encontrar um moto obstruindo a rampa de acessibilidade, a mesma desistência acontecerá, pois novamente aquela luta interna gritará “Deixa quieto, não tô em condições de brigar com ninguém, se ele (agressor) fez isso comigo, imagina os outros!”

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Acessibilidade arquitetônica: É aquela famosa ELIMINAÇÃO DAS BARREIRAS AMBIENTAIS FÍSICAS NOS EDIFÍCIOS, ESPAÇOS E EQUIPAMENTOS URBANOS. Um forte exemplo que desestimula a denúncia da mulher deficiente por causa da ausência desse tipo de acessibilidade? A sala, gabinete, o local onde é colhido o depoimento da vítima fica no segundo andar, mas o elevador está quebrado, dificultando o acesso da mulher.

 

Acessibilidade comunicacional: É aquela que ELIMINA AS BARREIRAS NA COMUNICAÇÃOinterpessoal (face a face, língua de sinais), escrita (jornal, revista, livro, carta, apostila etc., incluindo textos em braile, uso do computador portátil) e virtual (acessibilidade digital). Novamente cito um motivo que desestimula a denúncia da mulher deficiente. A ausência de um intérprete na sala de depoimento em consonância com a Lei de Libras – e Decreto de Acessibilidade.

 

Acessibilidade programática: Não é nada mais nada menos que a ELIMINAÇÃO DE BARREIRAS PRESENTES NAS POLÍTICAS PÚBLICAS (leis, decretos, portarias, normas, regulamentos, entre outros). Ocorre quando o judiciário promove processos de sensibilização que envolve a informação, o conhecimento e a aplicação dos dispositivos legais e políticas relacionadas às garantias e à acessibilidade de pessoas com deficiência, por exemplo na hora de fazer uma denúncia, requerer um defensor público etc. Mas essas não têm conhecimento dos seus direitos e, em razão disso, não vislumbram a possibilidade de levar adiante qualquer processo que acarretaria em medidas protetivas, disciplinares etc. Suponhamos que alguns agravantes dentro do Estatuto da Pessoa com Deficiência poderiam “multiplicar” as medidas cabíveis a proteção da vítima. Essa acessibilidade se expressa, também, toda vez que novas leis, decretos, portarias são criadas com o objetivo de fazer avançar os direitos humanos em todos os seus âmbitos.

 

Enfim, fica mais que transparente quais são ALGUNS dos componentes do combustível que alimenta a sensação de impunidade do agressor quando a vítima é deficiente.

 

A dependência física, dificuldade de mobilidade, a falta de autonomia das vítimas pra chegarem às delegacias, propicia a “liberdade” pra que o agressor sinta “segurança” em cometer outros abusos que serão porta pra outros e outros agravando muito mais a situação da mulher agredida.

 

Avaliando todo esse cenário preocupante, uma pesquisa com embasamento na quantidade de atendimentos realizados pela Secretaria Nacional dos Direitos Humanos através do DISQUE 100em 2015, deixou claro que naquele ano, só no estado de São Paulo, mais de 15.000 (quinze mil) pessoas com deficiência registraram boletins de ocorrência.

 

Com certeza todos esses dados “ganhariam” algumas centenas a mais se houvesse uma “fiscalização”, uma “auditoria” mais funcional e eficaz no controle desses dados como prevê a lei brasileira de inclusão instituída em 2015. Explico:

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A Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 institui a lei brasileira de inclusão da pessoa com deficiência (Estatuto Da Pessoa Com Deficiência). No livro I, Parte Geral, Título II Dos Direitos Fundamentais, No Capítulo III Direito À Saúde, Art. 26 diz que: “Os casos de suspeita ou de confirmação de violência praticada contra a pessoa com deficiência serão objeto de notificação compulsória pelos serviços de saúde públicos e privados à autoridade policial e ao Ministério Público, além dos Conselhos dos Direitos da Pessoa com Deficiência.” Parágrafo único.  Para os efeitos desta Lei, CONSIDERA-SE VIOLÊNCIA CONTRA A PESSOA COM DEFICIÊNCIA QUALQUER AÇÃO OU OMISSÃO, PRATICADA EM LOCAL PÚBLICO OU PRIVADO, QUE LHE CAUSE MORTE OU DANO OU SOFRIMENTO FÍSICO OU PSICOLÓGICO.

 

Resumindo, quando uma vítima com deficiência procurar o sistema de saúde e for constatada a violência, é responsabilidade do mesmo sistema de saúde, documentar os fatos num “formulário” conhecido com “FICHA DE SITUAÇÕES DE AGRAVOS DE NOTIFICAÇÃO COMPULSÓRIA”

 

Existe em tramitação uma proposta da CPI Mista da Violência contra a Mulher que enviou pra o Congresso Nacional, o Projeto de Lei (PL 7371/14), solicitando a Criação de um Fundo Nacional de Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres, financiado por concessões de convênios através de investimentos visando o combate de políticas dessa espécie de crime. Como? Mobilizando campanhas de cautelas, prevenções contra a violência. Disponibilizando subsídios as vitimas, deliberando métodos didáticos em toda forma de conscientização e informação etc. Os detalhes desse Projeto podem ser consultados no site da Câmara dos Deputados. Adianto que o mesmo foi apresentado em 04 de abril de 2014 e, a ultima movimentação deu-se em 21 de fevereiro de 2017.

 

Sobre tudo isso que conversamos, hoje 07 de dezembro acontece a última audiência pública do Projeto Pauta Feminina de 2017. Lembrando que esse projeto é realizado mensalmente desde 2013 pela Procuradoria da Mulher do Senado e da Câmara dos Deputados e pela bancada feminina na Câmara. O tema abordado hoje é a “VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA MULHERES COM DEFICIÊNCIA” essa pauta foi escolhida integrando as ações tanto da 11ª Semana de Valorização da Pessoa com Deficiência do Senado e quanto da Campanha dos 16 dias de ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher.

 

Na ocasião, serão divulgados dados inéditos sobre a violência contra as mulheres. A divulgação dos dados propiciará uma estimativa da proporção de mulheres que já sofreram algum tipo de violência provocada por um homem, bem como outros fatores associados a essa violência.

 

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Ressalto que esse assunto TEM MUITO QUE SE DISCUTIR. Pretendo voltar com outras vertentes pra entendermos melhor a gravidade disso tudo. Por hoje é isso. Se tiver alguma dúvida, sugestão, reclamação, crítica… Envie sua mensagem paratulio.mendhes@tvintegracao.com.br. Até breve!

Source: Com ou sem deficiência. Não a violência sexual! | Blog Mão na Roda da Rede Globo