Projeto nasceu em disciplina que estuda formas de trabalhar com públicos especiais

Desde maio deste ano, cerca de 70 profissionais e estudantes da área de Turismo estão passando por aulas de Guiamento Inclusivo no Campus Maceió, do Instituto Federal de Alagoas (Ifal). São aulas na área de legislação, além de apontamentos sobre o perfil e a elaboração de roteiros turísticos para cegos. A ideia foi elaborada por duas alunas no curso de Gestão em Turismo, como projeto de extensão e surgiu depois de participarem da disciplina de Turismo Inclusivo.

Fabiana Viana e Monique Morais já haviam passado pela disciplina e agora, como instrutoras do curso de extensão, repassam para os guias de turismo e comunidade interessada o conhecimento adquirido no relacionamento e planejamento de ações com os turistas cegos. No projeto de extensão, elas discutem a acessibilidade e as barreiras do lazer turístico para aquele público.

Entre as aulas práticas está o vedamento dos olhos de parte dos alunos e o posicionamento de seus colegas na função de guias, para que percorram os corredores do Instituto e enfrentem os obstáculos comuns vivenciados diariamente pelos cegos e assim possam se sensibilizar com a situação daquele público. Veja vídeo.

“O curso busca nos colocar como nos sentiríamos enquanto deficiente, por exemplo, como queremos ser segurados pelo guia, na hora de entrar no carro. Simulamos a possibilidade de localizar o deficiente na praia. Como é que o deficiente pode chegar até ela? Será que ela é acessível. Como é que nos devemos nos comportar enquanto guias?”, detalhou Nazarethe Campos, aluna do curso e guia turístico nacional.

Iniciativa surgiu de graduandas

Monique lembra que o projeto surgiu após um levantamento que ela e outro aluno do curso de Gestão em Turismo, Thamyson Medeiros, realizaram, em parceria com o Instituto de Computação da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), em que se verificou que, apesar de mais de 90% dos pontos turísticos de Maceió estarem acessíveis para pessoas com deficiência física ou motora, apenas 27% desses locais estão aptos a receber pessoas com deficiência visual e apenas 18% deles são acessíveis para pessoas com deficiência auditiva.

“Essa estatística não saiu da minha cabeça e percebi a necessidade de fazer alguma coisa para mudar essa realidade. Entrei em contato com a Fabiana e iniciamos as pesquisas acerca do tema. Apresentamos a proposta a professora Valéria Goia, que aceitou participar do projeto e usamos toda a experiência teórica adquirida nas aulas de Turismo Inclusivo”, lembrou Monique.

Para elaborar o curso, elas ainda contaram com a ajuda do presidente da Associação de Cegos de Alagoas (ACAL), Roberto Freire, que as apresentou a audiodescrição, recurso que permite a inclusão de pessoas com deficiência visual em cinema, teatro, passeios, casamentos, programas de televisão e outros.

Fabiana relata que os guias encontram dificuldades em como adaptar o seu trabalho, geralmente voltado para os usuários videntes aos cegos. Parte dos museus, por exemplo não tem audiodescrição, o que impossibilita aos usuários ter acesso aos utensílios a partir da fala. Então caberia aos profissionais repensar nos itinerários e adaptá-los as limitações de seus usuários.

“É completamente diferente. O guia tem que se preocupar desde a hora que ele pega o deficiente no hotel, até o seu retorno. Como o cego não pode ver, então o guia terá que se preocupar um pouco mais a dar atenção ao usuário que possui essa limitação”, enfatiza Fabiana, ao lembrar também que os restaurantes e demais espaços turísticos de Alagoas não possuem as adaptações necessárias aos deficientes físicos.

Projeto nasceu em disciplina que estuda formas de trabalhar com públicos especiais

Valéria Goia, responsável pela disciplina de Turismo Inclusivo, relata que desde 2003 já vem promovendo aulas voltadas para o atendimento de pessoas com necessidades especiais. Nesse tempo, ela buscou sensibilizar os alunos para trabalhar com públicos especiais, sejam aqueles que apresentam limitações visuais, auditivas, ou de locomoção, como também aqueles cujas especificidades são outras, como obesos, gestantes e o público LGBT [Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros].

“Como era uma disciplina muito abrangente, a gente reformulou o curso e mudamos a nomenclatura para Turismo Inclusivo, em 2009. Desde o início a gente fez contato com a escola de cegos Ciro Accioly, entrevistamos deficientes visuais. Eu aprendi na escola como ajudá-los a se locomover em eventos, por exemplo, e passamos isso para os alunos”, lembra Valéria.

O curso de Guiamento Inclusivo também possui a participação de outros cegos. “Os relatos que ouvimos de pessoas com deficiência visual que tiveram e tem dificuldades no dia a dia para se locomover e ainda sofrem preconceito são impactantes. É maravilhoso saber que o curso não beneficia apenas os guias de turismo, que é o público-alvo,  mas também as pessoas com deficiência visual”, se entusiasma a graduanda.

No dia 30 de agosto as duas primeiras turmas terminarão o curso. Os encontros acontecem todas as terças-feiras.Nestas últimas semanas de aulas, os alunos estão sendo instigados a pensar em roteiros turísticos apropriados e deverão realizar no próximo dia 23 uma experiência real de guiamento com cegos pela cidade de Maceió.

Início de novas turmas

Como Fabiana e Monique perceberam o interesse de outros profissionais pelo curso, já em setembro serão iniciadas outras duas novas turmas e desta vez, serão abertas vagas para 100 participantes, com inscrições gratuitas. O curso também acontecerá no Campus Maceió. ”Já existe uma lista de espera com mais de 70 nomes de interessados dos estados de Pernambuco, Sergipe e Bahia e também recebemos o convite para levar o curso à cidade de Aracajú, para fazer um curso lá”, pontuou Monique.

A data das inscrições ainda não estão disponíveis, mas é possível acompanhar e buscar novas informações no perfil do Facebook, do curso Guiamento Inclusivo.

Fonte: IFAL