Pesquisa reforça necessidade de descontaminação de instrumentos cirúrgicos

RIO — A controversa teoria de que “sementes” do mal de Alzheimer podem ser transmitidas entre pacientes durante procedimentos cirúrgicos envolvendo a doação de tecido humano pode ser reforçada por um estudo divulgado esta semana.
Os cientistas encontraram uma ligação entre pacientes que receberam enxertos de tecidos nervosos algumas décadas atrás e a presença de uma proteína no cérebro que normalmente é vista nos primeiros estágios do mal de Alzheimer.
A pesquisa corrobora outro levamento publicado em setembro, que afirmava que as pessoas que receberam injeções de hormônio do crescimento durante a infância abrigavam “sementes” do mal de Alzheimer no momento de sua morte, várias décadas mais tarde.
O novo estudo foi realizado com amostras cerebrais armazenadas de oito pacientes que receberam enxertos de tecidos na Áustria e na Suíça, mas que haviam morrido de uma outra doença cerebral, a doença de Creutzfeldt-Jakob (CJD). Ela é conhecida por ser transmitida durante operações que envolvem o tecido nervoso extraído de cadáveres humanos.
Sete dos oito pacientes, que morreram quando tinham entre 28 e 63 anos, contavam com aglomerados de uma proteína em seu cérebro chamada beta-amiloide (beta-A). Ela é vista nas fases iniciais do mal de Alzheimer, mas é altamente incomum na faixa etária dos indivíduos analisados.
Cinco dos pacientes mortos também sofreram danos visíveis em vasos sanguíneos cerebrais causados pelo acúmulo da proteína beta-A — outro fator pouco comum entre os indivíduos que tiveram a idade analisada.
O levantamento comparou o cérebro destes pacientes com o de vítimas de CJD e viram que as características eram diferentes. Portanto, é provável que a causa da morte dos cinco indivíduos seria outra – provavelmente o enxerto de tecidos.
Outras possibilidades, no entanto, ainda devem ser avaliadas. Mas os cientistas cogitam que a proteína beta-A tenha sido transmitida aos pacientes no momento em que houve a introdução cirúrgica da dura-máter, uma membrana que cobre o cérebro e a medula espinhal — que na épóca vinha de cadáveres, até a prática ser interrompida, na década de 1980.
Esta é a mais nova pesquisa a defender a hipótese de que alguns procedimentos médicos podem inadvertidamente transmitir “sementes” do mal de Alzheimer de uma pessoa para outra – embora ninguém cogite que o Alzheimer pode ser “contagioso” a partir do toque de um portador da doença neurodegenerativa.
“A presença da proteína beta-A em indivíduos jovens é extremamente incomum e sugere uma relação causal com os enxertos da membrana dura-máter”, ressaltam os pesquisadores do Hospital Universitário de Zurique e da Universidade de Medicina de Viena, liderados por Herbert Budka, do Instituto de Neuropatologia de Zurique. “As evidências crescentes desse tipo de transmissão devem levar a avaliações do procedimento de descontaminação de instrumentos cirúrgicos e de origem biológica, com o objetivo de assegurar a completa ausência de contaminantes potencialmente transmissíveis”.
No ano passado, um estudo destacou que um pequeno grupo de pessoas que haviam recebido na infância injeções de hormônio do crescimento preparado a partir de cadáveres humanos, e que morreram devido à CJD, também continham proteína beta-A no cérebro.
À época, o diretor do Departamento de Doenças Neurodegenerativas da Universidade College London, John Collinge, explicou que poderia haver novas rotas para o desenvolvimento do mal de Alzheimer, através de instrumentos cirúrgicos contaminados ou produtos médicos.